Pedido de esclarecimento sobre férias não gozadas
I - O pedido:
O Senhor Presidente da Junta de Freguesia …, através de email de 01 de julho de 2025, vem solicitar parecer sobre o seguinte:
“Um trabalhador esteve de baixa prolongada, pela Segurança Social (início a setembro de 2023), tendo o mesmo retomado ao serviço a 1 de fevereiro de 2025. O contrato deste trabalhador tinha sido suspenso. Agora, com o seu regresso, é nosso entender o seguinte:
1) o trabalhador tem de efetivar 6 meses de trabalho para ter direito ao gozo de 2 dias de férias por cada mês completo de trabalho, logo, ao fim deste período (fevereiro a julho) tem direito a 12 dias de férias e receber o subsídio de férias referente a esse tempo.
Relativamente ao acima exposto, a nossa dúvida é:
a) o pagamento do subsídio de férias/25 é a totalidade do subsídio ou o proporcional aos 6 meses?
b) ao fim de 6 meses tem direito ao gozo de 12 dias, mas a lei refere que nesse ano, não pode gozar mais de 20 dias, sendo assim, de agosto a dezembro o trabalhador só goza o remanescente, ou seja 8 dias?”
II - Análise:
Aos trabalhadores da administração pública, detentores de vínculo de emprego público, inscritos na Segurança Social, aplica-se o Regime Geral de Segurança Social dos trabalhadores por conta de outrem (RGSS), que assegura a proteção na doença, através do subsídio por doença[1].
Sobre os efeitos das faltas por doença dadas por trabalhadores abrangidos pelo RGSS, a Direção-Geral da Administração e do Emprego Público[2] nas suas FAQ sobre a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, esclarece, desde logo, a questão da suspensão do vínculo de emprego público:
Sim. O impedimento temporário por facto não imputável ao/à trabalhador/a integrado/a no RGSS, designadamente doença, determina a suspensão do vínculo de emprego público quando o impedimento tenha uma duração superior a um mês. O vínculo considera-se suspenso mesmo antes de decorrido este prazo a partir do momento em que se preveja uma duração do impedimento superior a 30 dias.”
Neste caso, sendo um trabalhador integrado no RGSS, o impedimento temporário por doença quando se prolongue por mais de um mês, constitui um facto que determina a suspensão do vínculo de emprego público, de acordo com os n.ºs 1 e 2 do artigo 278.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, LGTFP, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (versão atualizada).
De seguida, importa resolver os efeitos da suspensão do vínculo nas férias do trabalhador, remetendo-se, igualmente, para as FAQ da DGAEP[3], em particular, para o exemplo que se enquadra na situação concreta:
“3.2. A suspensão do vínculo inicia-se num determinado ano e termina em ano civil diferente:
Encontrando-se o vínculo suspenso no dia 1 de janeiro, o/a trabalhador/a inscrito/a no RGSS não adquire direito ao período normal de férias.
Com o regresso à atividade, o/a trabalhador/a tem direito a gozar dois dias úteis de férias por cada mês completo de serviço, contando-se, para o efeito, todos os dias, seguidos ou interpolados, em que foi prestado trabalho.
O gozo deste direito não está condicionado à prestação de trabalho por um período mínimo de 6 meses.”
Aplica-se, deste modo, a regra prevista no n.º 3 do artigo 126.º da LGTFP, que determina que o direito a férias vence-se no dia 1 de janeiro, pelo que, encontrando-se o trabalhador com o vínculo de emprego suspenso nesta data, não adquire direito ao período normal de férias.
Para estes casos, decorre da própria LGTFP a aplicação de um regime específico de suspensão do vínculo de emprego público (artigo 278.º) e seus efeitos (artigo 129.º), do qual resulta, para o caso concreto, que o trabalhador tem direito a gozar dois dias úteis de férias por cada mês completo de prestação de trabalho, devendo contar-se todos os dias, seguidos ou interpolados, em que este foi prestado (n.ºs 1 e 2 do artigo 127.º, por remissão do n.º 2 do artigo 129.º).
Em consequência, regulando a LGTFP esta matéria, conclui-se que estas normas prevalecem sobre a aplicação do Código do Trabalho, tal como assegura o n.º 1 do artigo 126.º da LGTFP[4], e neste seguimento, o gozo deste direito não está condicionado à prestação de trabalho por um período mínimo de 6 meses, nem ao limite de 20 dias de férias, que são condições estipuladas no Código do Trabalho, para o ano de admissão (n.º 1 do artigo 239.º deste Código).
Quanto ao subsídio de férias importa considerar, igualmente, as disposições da LGTFP que regulam o direito à remuneração e as suas componentes, porque o subsídio de férias integra as 14 mensalidades da remuneração base anual (n.º 2 do artigo 150.º).
Nesta matéria, sobre a remuneração do período de férias, o artigo 152.º da LGTFP, estabelece no seu n.º 2 que o trabalhador tem direito a um subsídio de férias de valor igual a um mês de remuneração base mensal, que deve ser pago por inteiro no mês de junho de cada ano ou em conjunto com a remuneração mensal do mês anterior ao do gozo das férias, quando a aquisição do respetivo direito ocorrer em momento posterior.
E, nestes termos, a suspensão do contrato por doença do trabalhador não prejudica o direito ao subsídio de férias, conforme previsto no n.º 3 do mesmo artigo.
Sobre a interpretação desta norma, os autores Paulo Veiga e Moura e Cátia Arrimar[5], concluem que o subsídio de férias corresponderá a uma mensalidade da remuneração base apenas quando o trabalhador tiver 22 ou mais dias úteis de férias, pois, se tiver menos dias de férias, o valor do subsídio corresponderá a tantos dias de remuneração base quantos os dias de férias a que tenha direito, conforme a seguir se transcreve:
“A redação do n.º 2 parece apontar no sentido de o valor do subsídio de férias ser independente do número de dias de férias a que o trabalhador tenha direito, como se o montante do subsídio fosse sempre igual a uma mensalidade da remuneração base e o processamento do respetivo valor não devesse atender nem variar consoante o período de férias a que cada trabalhador tenha direito.
Não nos parece ser essa a melhor interpretação da lei, devendo a mesma ser interpretada no sentido de o montante do subsídio de férias depender do número de dias de férias a que cada trabalhador tenha direito, até por nos parecer de todo inaceitável que, sendo o objetivo de tal subsídio permitir fazer face ao crescendo de despesas que as férias implicam, quem apenas tenha direito a quatro ou cinco dias de férias receba um subsídio inteiro e em valor idêntico quem tenha vinte e dois ou mais dias de férias (e a majoração dos dias de férias a que aludem os n.ºs 4 e 5 do art.º 126.º é irrelevante para efeitos de aumento do valor do subsídio de férias).
Entendemos, como tal que (…) continua a vigorar a regra constante do n.º 1 do art.º 11.º do DL n.º 496/80, pelo que o subsídio de férias corresponderá a uma mensalidade da remuneração base apenas quando o trabalhador tiver 22 ou mais dias úteis de férias, pois, se tiver menos dias de férias, o valor do subsídio corresponderá a tantos dias de remuneração base quantos os dias de férias a que tenha direito.”
III – Em conclusão:
De acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 127.º, por remissão do n.º 2 do artigo 129.º, ambos da LGTFP, com o regresso ao serviço, o trabalhador tem direito a gozar dois dias úteis de férias por cada mês completo de serviço, contando-se, para o efeito, todos os dias, seguidos ou interpolados, em que foi prestado trabalho;
Nos termos legais expostos, o gozo deste direito não está condicionado à prestação de trabalho por um período mínimo de 6 meses, nem ao limite de 20 dias de férias;
O valor do subsídio de férias corresponde a tantos dias de remuneração base quantos os dias de férias a que tenha direito, até final do ano (n.ºs 2 e 3 do artigo 152.º da LGTFP);
Sobre o mês de janeiro, ou sobre o período de suspensão do vínculo, em geral, sugere-se que a entidade consulente coloque junto dos serviços da Segurança Social as questões que entender necessárias sobre as remunerações correspondentes a este período.
[1] São os trabalhadores titulares de relação jurídica de emprego público, independentemente da modalidade de vinculação, constituída a partir de 1 de janeiro de 2006, ou os demais trabalhadores, titulares de relação jurídica de emprego constituída até 31 de dezembro de 2005 com entidade empregadora, enquadrados no regime geral de segurança social, nos termos do artigo 7.º da Lei n.º 4/2009, de 29 de janeiro, que define a proteção social dos trabalhadores que exercem funções públicas.
[2] Em: DGAEP - Direção-Geral da Administração e do Emprego Público - XI-B - Efeitos da suspensão do vínculo nas férias do/a trabalhador/a do RGSS.
[3] V. nota anterior - Questão XI-B.
[4] De acordo com o n.º 1 do artigo 126.º da LGTFP, o trabalhador tem direito a um período de férias remuneradas em cada ano civil, nos termos previstos no Código do Trabalho e com as especificidades dos artigos seguintes. As especificações da LGTFP são as constantes dos artigos 126.º a 132.º.
[5] Moura, Paulo Veiga e, Arrimar, Cátia (2014, p.460), Comentários à Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, 1.ª ed., Coimbra Editora.
