Parecer/informação – Lei n.º 69/2021 de 20 de outubro

Deu entrada nesta CCDR Algarve, email datado de 05.01.2022, da Junta de Freguesia de … e que mereceu o registo n.º E00114-202201-AUT sobre o assunto em epígrafe em que é questionado o seguinte:

  1. A que órgão/entidade devemos informar da decisão de estar um dos membros a meio tempo;
  2. Essa decisão é aprovada pela assembleia de freguesia ou será apenas comunicado para conhecimento;
  3. Sendo a presidente de junta desta freguesia também funcionária da câmara municipal haverá incompatibilidade;
  4. Quem transfere essa verba para a junta de freguesia.

 

Vejamos.

I

 

A Lei n.º 69/2021, de 20 de outubro, altera os termos do exercício do mandato a meio tempo dos titulares das juntas de freguesia e procede à sétima alteração à Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, alterada pelas Leis n.os 5-A/2002, de 11 de janeiro, e 67/2007, de 31 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de novembro, e pelas Leis n.os 75/2013, de 12 de setembro, 7-A/2016, de 30 de março, e 71/2018, de 31 de dezembro, que estabelece o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias.

Assim, a Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na sua versão atual, ao estabelecer o quadro de competências, assim como o regime jurídico de funcionamento, dos órgãos dos municípios e das freguesias, determina no seu artigo 27.º, sob a epígrafe “Funções a tempo inteiro e a meio tempo” o seguinte:

1 - Em todas as juntas de freguesias o presidente pode exercer o mandato em regime de meio tempo.

2 - Nas freguesias com mais de 10 000 eleitores ou nas freguesias com mais de 7000 eleitores e de 100 km2 de área, o presidente da junta pode exercer o mandato em regime de tempo inteiro.

3 - Desde que suportado pelo orçamento da freguesia, e sem que o encargo anual com a respetiva remuneração ultrapasse 12 % do valor total geral da receita constante na conta de gerência do ano anterior, nem do valor inscrito no orçamento em vigor:

a) (Revogada.)

b) Pode exercer o mandato em regime de tempo inteiro o presidente de junta nas freguesias com até 10 000 eleitores.

c) Pode ainda exercer o mandato em regime de tempo inteiro mais um vogal do órgão executivo das freguesias com mais de 10 000 eleitores e o máximo de 20 000 ou das freguesias com mais de 7000 eleitores e de 100 km2 de área;

d) Podem ainda exercer o mandato em regime de tempo inteiro mais dois vogais do órgão executivo das freguesias com mais de 20 000 eleitores.

4 - Os tempos inteiros referidos nos números anteriores podem ser divididos em meios tempos, nos termos gerais.

5 - A possibilidade de exercício de funções a tempo inteiro habilita igualmente o exercício de funções apenas a meio tempo, nomeadamente nos casos em que tal seja necessário para assegurar o cumprimento dos limites com encargos anuais previstos no n.º 3.

6 - A possibilidade de exercício de funções a meio tempo nos termos do n.º 1, cujo pagamento de remunerações e encargos é assegurada pelo Orçamento do Estado, habilita igualmente o exercício de funções em regime de tempo inteiro desde que cumpridos os requisitos da alínea b) do n.º 3, caso em que a remuneração e encargos remanescentes são assegurados pelo orçamento próprio da freguesia.

7 - O número de eleitores relevante para efeitos dos números anteriores é o constante do recenseamento vigente na data das eleições gerais, imediatamente anteriores, para a assembleia de freguesia.

8 - O valor base da remuneração do presidente da junta de freguesia em regime de meio tempo é fixado em metade de cada escalão estabelecido nas alíneas do n.º 1 do artigo 5.º da Lei n.º 11/96, de 18 de abril, na sua redação atual.

 

De acordo com o n. º 1 deste artigo, em todas as juntas de freguesia o presidente pode exercer o mandato em regime de meio tempo.

Ora, de acordo com a alínea b) do n.º 3, o presidente da junta com até 10.000 eleitores, pode exercer o mandato em regime de tempo inteiro, desde que suportado pelo orçamento da freguesia e sem que o encargo anual com a respetiva remuneração ultrapasse 12 % do valor total geral da receita constante na conta de gerência do ano anterior, nem do valor inscrito no orçamento em vigor.

Estas são as condições que se têm de verificar para o exercício do mandato do presidente de junta em regime de tempo inteiro.

Porém, de acordo com o n. º 1 deste artigo, independentemente do n.º de eleitores e área da freguesia, em todas as juntas de freguesia o presidente pode exercer o mandato em regime de meio tempo.

Note-se que, nos termos da alínea q) do artigo 9.º da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, na sua atual redação, cabe à assembleia de freguesia, sob proposta da junta de freguesia, pronunciar-se sobre a verificação da conformidade dos requisitos relativos ao exercício de funções a tempo inteiro ou de meio tempo do presidente da junta de freguesia sendo que nos termos do n.º 2 alínea a) do artigo 18.º desta Lei é da competência do presidente da junta de freguesia “ Decidir sobre o exercício de funções em regime de tempo inteiro ou de meio tempo, nos termos da lei” , isto é, também nos termos do atrás citado artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na sua versão atual – sublinhado nosso.

II

Os eleitos locais estão legalmente definidos como os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios e das freguesias.

A Lei que consagra esta definição é a Lei nº 29/87, de 30/06, alterada pelas leis n.ºs 97/89, de 15.12; 1/9, de 10.01; 11/91, de 17.05; 11/96, de 18.04; 127/97, de 11/12; 50/99, de 24.06; 86/2001, de 10.08; 22/2004, de 17.06; 52-A/2005, de 10.10; 53-F/2006 de 29.12; 2/2020 de 31.03 –, a que doravante nos referiremos como o Estatuto dos Eleitos Locais (EEL).

Nem todos os direitos e deveres dos eleitos locais estão regulados exaustivamente no EEL, constando, por exemplo, alguns dos direitos dos eleitos das freguesias da Lei n.º 11/96, de 18 de abril, na sua redação atual.

Desde logo os autarcas são, eleitos locais e não funcionários públicos, pelo que o regime jurídico destes só lhes é aplicável se o seu próprio estatuto de eleitos (constante dos diplomas que acima citámos) remeter a estatuição de certas matérias para o regime da função pública. Tal só ocorre, se e quando, houver remissão para o regime da função pública. Assim, importa clarificar que os eleitos locais não podem ser prejudicados na respetiva colocação ou emprego permanente por virtude de desempenho dos seus mandatos[1] e sendo funcionários públicos se desempenharem funções em regime de tempo inteiro ou de meio tempo consideram-se em comissão extraordinária de serviço público (artigo 22 º do Estatuto dos eleitos locais, aplicável às freguesias pelo artigo 11 º da mencionada Lei n º 11/96).

Os eleitos locais em regime de meio tempo têm direito a metade das remunerações e subsídios fixados para os respetivos cargos em regime de tempo inteiro (artigo 8.º da Lei n.º 29/87 de 30.06).

Ora, no caso que nos vem colocado, a presidente da junta de freguesia a exercer o cargo a meio tempo, sendo simultaneamente trabalhadora do município com contrato de trabalho em funções públicas a tempo indeterminado e a tempo inteiro, não pode pelo facto de exercer funções autárquicas ser prejudicada no seu regime de origem.

Por outro lado, também a nosso ver, o município não pode ser prejudicado pelo facto do trabalhador não poder executar o total de horas de trabalho devidas a tempo completo conforme decorre do seu contrato inicial.

Como deverão então ser compatibilizadas estas duas situações de uma forma equilibrada?

Atendendo a que o desempenho de funções de presidente da Junta da Freguesia é efetuado em regime de meio tempo em comissão de serviço extraordinária, o outro meio tempo restante deverá ser prestado no município respetivo, com o qual a trabalhadora tem contrato de trabalho, agora com redução do período normal de trabalho[2] em regime de tempo parcial nos termos do disposto no artigo 155.º n.º1 da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua redação atual (Código do Trabalho), por remissão do artigo 68.º, n.º 1, da Lei n.º35/2014 de 20 de junho que aprova a Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LTFP). Assim, terá de ser materializado esse acordo, por escrito, com a entidade empregadora.

Contudo, não tendo a entidade consulente prestado informação sobre as funções exercidas enquanto trabalhadora em funções públicas na autarquia, há que ter em atenção a inelegibilidade especial estabelecida pela alínea d) do n.º 1 do art.º 7.º da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto: “Os funcionários dos órgãos das autarquias locais ou dos entes por estas constituídos ou em que detenham posição maioritária, que exerçam funções de direção, salvo no caso de suspensão obrigatória de funções desde a data de entrega da lista de candidatura em que se integrem.”.

III

Relativamente à 4.ª e última questão transcrevemos o que sobre a matéria refere a Direção – Geral das Autarquias Locais - DGAL[3].

 

“ A Lei n.º 75-B/2020, de 31 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2021 [aplicável por via da prorrogação da vigência da Lei do Orçamento do Estado, nos termos do artigo 58.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2 da Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro (Lei de Enquadramento Orçamental)] prevê, no artigo 107.º, que a distribuição pelas freguesias do montante reservado ao cumprimento do n.º 1 do artigo 10.º da Lei n.º 11/96, de 18 de abril, depende da informação que os eleitos remetem, até ao fim do primeiro semestre, à Direção-Geral das Autarquias Locais (DGAL) referindo se optam ou não pelo regime da permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo.

As freguesias cujos presidentes reúnem as condições previstas nos n.os 1 e 2 do artigo 27.º da Lei n.º 169/99, de 18 de setembro, na sua redação atual, com as alterações que resultam da Lei n.º 69/2021, de 20 de outubro, devem informar a DGAL acerca da opção pelo regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo, através do preenchimento de formulário eletrónico próprio até ao final do dia 30 de junho de 2022.

O formulário está disponível em http://www.portalautarquico.dgal.gov.pt - Acesso Reservado/Eleitos Locais/Nova Caracterização.

A password de acesso ao portal autárquico, para registo da caracterização, deve ser a da junta de freguesia.

A caracterização do corrente ano tem como data de início 01-01-2022 e data de fim 31-12-2022. Para o efeito devem ser seguidos os seguintes procedimentos:

1. Deve ser digitalizado e submetido o documento comprovativo da decisão de atribuição do regime de permanência, a tempo inteiro ou a meio tempo, do eleito (exemplo ata de reunião do executivo da freguesia).

2. Após o preenchimento da caracterização deverão carregar em "Confirmar".

Remunerações dos Eleitos Locais pelo Orçamento do Estado (art.º 27.º, n.os 1 e 2 da Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro e art.º 10.º da Lei n.º 11/96)

I. Tempo Inteiro - freguesias com mais de 10 mil eleitores(a) ou nas freguesias com mais de 7 mil eleitores e 100 km2 de área, o presidente da junta pode exercer o mandato a tempo inteiro. Encontram-se nesta situação 225 freguesias (215 e 10, respetivamente) das 3 091 atualmente existentes.

Neste caso, os Presidentes de Junta a tempo inteiro têm direito, nos termos da Lei n.º 11/96, de 18 de abril, ao pagamento pelo Orçamento do Estado de:

i) Remuneração (art.º 5.º), deduzida da compensação mensal para encargos;

ii) Despesas de representação (12 vezes por ano, art.º 5.º-A);

iii) Dois subsídios extraordinários anuais de montante igual à remuneração (art.º 6.º);

iv) Segurança Social - varia de acordo com a situação laboral do eleito local (respeitante ao encargo com a Segurança Social ou Caixa Geral de Aposentações por parte da Freguesia);

v) Subsídio de Refeição.

II. Meio Tempo – nas restantes 2 866 freguesias, os presidentes de junta podem exercer o mandato em regime de meio tempo e têm direito a metade da remuneração fixada para os respetivos cargos em regime de tempo inteiro.

Neste caso, são suportadas pelo Orçamento do Estado apenas as remunerações (art.º 5.º da Lei n.º 11/96, de 18 de abril), deduzida da compensação mensal para encargos, bem como os dois subsídios extraordinários anuais.

É igualmente concedido aos eleitos em regime de meio tempo, o direito à Segurança Social acima referido, conforme determina o n.º 3, art.º 5.º da Lei 29/87, de 30 de junho.

São assim consideradas como freguesias remuneráveis pelo Orçamento do Estado um total de 3.091 freguesias.

  1. O número de eleitores tem por referência os eleitores inscritos à data das últimas eleições gerais autárquicas.”

 

 

Assim e em síntese podemos concluir:

  1. A decisão do exercício a meio tempo de titular da junta de freguesia deve ser dada conhecimento/comunicada à assembleia da junta de freguesia respetiva e à DGAL.
  2. O exercício do mandato do presidente da junta de freguesia não é incompatível com o desempenho de funções no município do trabalhador com contrato de trabalho em funções públicas a tempo indeterminado na exata medida do que se referiu anteriormente;
  3. A verba é transferida do orçamento do Estado através do procedimento a que nos referimos em III.

 

É o que nos cumpre informar sobre o solicitado.

 

 

[1] Aliás o n.º 2 do artigo 50.º da Constituição da República Portuguesa sob a epígrafe “Direito de acesso a cargos públicos” determina: “2. Ninguém pode ser prejudicado na sua colocação, no seu emprego, na sua carreira profissional ou nos benefícios sociais a que tenha direito, em virtude do exercício de direitos políticos ou do desempenho de cargos públicos.”

[2] Artigo 276.º n.º 1 da LTFP que dispõe: “1 - A redução do período normal de trabalho ou a suspensão do vínculo de emprego público pode fundamentar-se na impossibilidade temporária, respetivamente, parcial ou total, da prestação do trabalho, por facto respeitante ao trabalhador, e no acordo das partes.”

[3] Consultável em: http://www.portalautarquico.dgal.gov.pt/pt-PT/financas-locais/transfere…

Data de Entrada
Número do Parecer
2022/013