Pedido de esclarecimento sobre suspensão de mandato na Assembleia de Freguesia
O Senhor Presidente da Assembleia de Freguesia da…, através de email de 17 de setembro de 2025, vem solicitar o seguinte esclarecimento:
"No caso de um dos elementos da Assembleia de Freguesia pedir a suspensão temporária do mandato, a quem compete a convocatória para o preencher o lugar vago. Ao presidente da Mesa compete receber o pedido de substituição e confirmar se o elemento que está em substituição confere e legalidade para o efeito, ou seja, se é o elemento imediatamente a seguir a quem apresentou o pedido de suspensão, mas compete ao Presidente da Mesa, obrigatoriamente, o envio da convocatória para esse elemento suplente de determinada lista?
Não poderá o Líder da Bancada, a convocar o seu elemento suplente para assumir o lugar na sessão da Assembleia?
Já verifiquei a Lei 5-A/2002 e a Lei 75/2013 e fico na dúvida desta obrigatoriedade do Presidente da Mesa de fazer as convocatórias em resposta a pedidos de substituição.”
Através de email de 23 de outubro de 2025, o Sr. Presidente desta Assembleia de Freguesia veio confirmar interesse no esclarecimento em causa, não obstante a realização das eleições autárquicas, e acrescentou uma outra questão “sobre a obrigatoriedade da gravação (áudio e/ou vídeo) das sessões das Assembleia de Freguesia. Essa decisão é da responsabilidade da Assembleia aquando da aprovação do regimento? E se se decidir pela obrigatoriedade, há a obrigação da publicação das gravações nos sites das respetivas freguesias? ou pode ficar a gravação só para apoio para a redação das atas?”
II - Análise:
- Quanto à substituição de membro da Assembleia:
Face ao caso descrito, verifica-se que se trata de uma ausência temporária, e embora não seja mencionado o seu motivo ou causa, nem o seu início e termo, tendo em conta a data das eleições autárquicas, poderá corresponder a um período inferior a 30 dias.
Ora, nessa hipótese, é aplicável a figura da substituição, prevista no artigo 78.º do regime jurídico de funcionamento dos órgãos dos municípios e das freguesias, aprovado pela Lei n.º 169/99, de 18 de dezembro (versão atualizada), que permite aos membros dos órgãos das autarquias locais, caso o pretendam, fazerem-se substituir, sem necessidade de fundamentarem a sua pretensão ou aguardarem pela autorização do respetivo órgão autárquico, da seguinte forma:
“Artigo 78.º
Ausência inferior a 30 dias
1 - Os membros dos órgãos das autarquias locais podem fazer-se substituir nos casos de ausências por períodos até 30 dias.
2 - A substituição obedece ao disposto no artigo seguinte e opera-se mediante simples comunicação por escrito dirigida ao presidente do órgão respetivo, na qual são indicados os respetivos início e fim.”
Por força desta remissão, para o artigo seguinte, que regula o preenchimento das vagas, aplicam-se as seguintes regras:
“Artigo 79.º
Preenchimento de vagas
1 - As vagas ocorridas nos órgãos autárquicos são preenchidas pelo cidadão imediatamente a seguir na ordem da respetiva lista ou, tratando-se de coligação, pelo cidadão imediatamente a seguir do partido pelo qual havia sido proposto o membro que deu origem à vaga.
2 - Quando, por aplicação da regra contida na parte final do número anterior, se torne impossível o preenchimento da vaga por cidadão proposto pelo mesmo partido, o mandato é conferido ao cidadão imediatamente a seguir na ordem de precedência da lista apresentada pela coligação.”
Deste modo, a substituição opera-se mediante simples comunicação por escrito, dirigida ao presidente do órgão respetivo, na qual são indicados o início e o fim dessa ausência, podendo fazer-se substituir ou não, conforme a faculdade prevista no n.º 1 do artigo 78.º, acima transcrito.
Existindo tal indicação na comunicação em causa, a substituição obedece às regras previstas para o preenchimento de vagas, indicadas no artigo 79.º, por força da remissão do n.º 2 do artigo 78.º, isto é, pelo cidadão imediatamente a seguir na ordem da respetiva lista ou, tratando-se de coligação, pelo cidadão imediatamente a seguir do partido pelo qual havia sido proposto o membro que deu origem à vaga.
Caso a ausência seja superior a 30 dias, por motivo ou causa fundamentada, aplica-se a figura da suspensão, nos termos do artigo 77.º da mesma Lei:
“Artigo 77.º
Suspensão do mandato
1 - Os membros dos órgãos das autarquias locais podem solicitar a suspensão do respetivo mandato.
2 - O pedido de suspensão, devidamente fundamentado, deve indicar o período de tempo abrangido e é enviado ao presidente e apreciado pelo plenário do órgão na reunião imediata à sua apresentação.
3 - São motivos de suspensão, designadamente:
a) Doença comprovada;
b) Exercício dos direitos de paternidade e maternidade;
c) Afastamento temporário da área da autarquia por período superior a 30 dias.
4 - A suspensão que, por uma só vez ou cumulativamente, ultrapasse 365 dias no decurso do mandato constitui, de pleno direito, renúncia ao mesmo, salvo se no primeiro dia útil seguinte ao termo daquele prazo o interessado manifestar, por escrito, a vontade de retomar funções.
5 - A pedido do interessado, devidamente fundamentado, o plenário do órgão pode autorizar a alteração do prazo pelo qual inicialmente foi concedida a suspensão do mandato, até ao limite estabelecido no número anterior.
6 - Enquanto durar a suspensão, os membros dos órgãos autárquicos são substituídos nos termos do artigo 79.º.
7 - A convocação do membro substituto faz-se nos termos do n.º 4 do artigo 76.º.”
Com base no regime descrito, verifica-se que o pedido é apreciado e objeto de deliberação pelo plenário do órgão autárquico, que poderá conceder ou não a suspensão do mandato.
São causas de suspensão, nos termos do n.º 3 deste artigo, nomeadamente, doença comprovada, exercício dos direitos de paternidade e maternidade ou de afastamento temporário da área da autarquia por período superior a 30 dias.
Enquanto durar a suspensão, os membros dos órgãos autárquicos são substituídos com recurso às regras já identificadas (artigo 79.º), e a convocação do membro substituto compete ao presidente do órgão, por aplicação conjugada do disposto no n.º 7 do artigo 77.º e nos n.ºs 2 e 4 do artigo 76.º, todos do regime jurídico aprovado pela Lei n.º 169/99, de 18 de dezembro (versão atualizada)[1].
- Quanto à gravação (áudio e/ou vídeo) das sessões das Assembleia de Freguesia:
Até 30 de junho de 2022, no âmbito do quadro legal criado para responder à pandemia de covid-19, o artigo 3.º da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, previa a realização das reuniões dos órgãos deliberativos e executivos das autarquias locais por videoconferência ou outros meios de comunicação digital ou à distância[2].
A partir daqui deixou de existir qualquer previsão legal sobre a divulgação da atividade plenária dos órgãos autárquicos desta forma.
No entanto, conforme se constata de vários regulamentos publicados em Diário da República, a gravação áudio e vídeo das sessões de assembleia municipal ou de freguesia, tem sido, de um modo geral, adotada.
De facto, a sua prática requer a previsão desta possibilidade no regimento do órgão[3], que, no exercício do poder regulamentar[4], de acordo com as competências previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro (versão atualizada), deverá, ainda, regular todas as condições quanto à utilização dos meios e quanto ao consentimento que deve ser prestado por todos os intervenientes e participantes nas sessões.
Reconhecendo-se, deste modo, que tal possibilidade envolve a proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados, nos termos da Lei de Proteção de Dados Pessoais, aprovada pela Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto.
Nestes termos, suscita a intervenção da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), enquanto entidade administrativa com poderes de autoridade para o controlo dos tratamentos de dados pessoais, conferidos pelo Regulamento (UE) 216/279 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016 (RGPD), e pela Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto[5].
E assim, remete-se a entidade consulente para a informação disponibilizada pela CNPD[6], relativa às situações em que deverá ser realizada avaliação de impacto sobre a proteção de dados, em especial:
“Quando a avaliação de impacto indicar que o tratamento de dados que se pretende efetuar, apesar das medidas mitigadoras a adotar, resulta ainda num elevado risco para os direitos e liberdades dos indivíduos, o responsável pelo tratamento submete o tratamento de dados em causa a consulta prévia da CNPD (cf. artigo 36.º do RGPD)”.
Os pareceres emitidos na sequência desta consulta encontram-se publicados na página desta entidade[7], sugerindo-se, ainda, a consulta da Orientação de 18 de abril de 2023[8], destacando-se as seguintes recomendações:
“(…) o facto de as imagens e som, uma vez disponibilizados online, serem suscetíveis de reutilização e difusão por terceiros.
(…) o referido consentimento deve ser recolhido não apenas em relação àqueles que, no exercício das suas funções ou no exercício do direito de participação, façam declarações durante as reuniões, como também em relação aos que exercem o mesmo direito de participação através da mera presença ou assistência naquelas.
(…) durante o processo de captação de imagem e som tem de se assegurar que não sejam captadas imagens nem as declarações de qualquer das pessoas que para tal não tenham dado consentimento.
(…) a CNPD recomenda ainda que a transmissão ocorra apenas no sítio da Internet da entidade pública, em conformidade com os princípios da proporcionalidade e da minimização dos dados (consagrados no n.º 2 do artigo 266.º da CRP e na alínea c) do n.º 1 do artigo 5.º do RGPD) e salvaguardando o princípio da administração aberta, assim respeitado por ser aquela a sede própria para a divulgação da atividade municipal de acordo com a legislação autárquica.”
III – Conclusões:
- Quanto à substituição de membro da Assembleia:
- A substituição opera-se mediante simples comunicação por escrito, dirigida ao presidente do órgão respetivo, na qual são indicados o início e o fim dessa ausência, podendo fazer-se substituir ou não, conforme a faculdade prevista no n.º 1 do artigo 78.º da Lei n.º 169/99, de 18 de dezembro (versão atualizada);
- Caso se trate de causa ou motivo de suspensão, a convocação do membro substituto compete ao presidente do órgão, por aplicação conjugada do disposto no n.º 7 do artigo 77.º e nos n.ºs 2 e 4 do artigo 76.º, da mesma Lei.
- Quanto à gravação (áudio e/ou vídeo) das sessões das Assembleia de Freguesia:
- Qualquer gravação (áudio e/ou vídeo) requer a sua previsão no regimento da Assembleia de Freguesia, competindo, ainda, a este órgão, de acordo com as competências previstas na alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do Anexo I da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro (versão atualizada), regular a forma e os termos da utilização desses meios;
- Nos termos das alíneas 1) e 2) do artigo 4.º do Regulamento (UE) 2016/679, de 27 de abril de 2016 (RGPD), por implicar a recolha e divulgação de informação relativa a pessoas singulares identificadas ou identificáveis, corresponde a um tratamento de dados pessoais;
- Nestes termos, o projeto de regulamento que tenha por objeto a gravação (áudio e/ou vídeo) das sessões das Assembleia de Freguesia, deverá ser submetido à consulta prévia da CNPD, nos termos do artigo 36.º do RGPD, de acordo com as competências desta entidade, previstas no artigo 3.º e no n.º 2 do artigo 4.º, ambos da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto.
[1] O n.º 7 do artigo 77.º manda aplicar a regra prevista no n.º 4 do artigo 76.º (Renúncia), que refere que a convocação do membro substituto compete à entidade referida no n.º 2 do mesmo artigo, resultando desta conjugação que compete ao presidente do órgão.
[2] Este diploma foi revogado pela Lei n.º 31/2023, de 4 de julho.
[3] Neste sentido, entre outros, destacam-se os seguintes pareceres: Parecer da CCDR Centro, I.P. n.º 17/2022, acessível em: 2022-01-27 Parecer DSAJAL 17/2022 – ccdrc; Parecer da CCDR Norte, I.P./INF_DSAJAL_TL_13973/2021, acessível em: Transmissão on-line das reuniões públicas do órgão executivo e das reuniões do órgão deliberativo da freguesia.pdf
[4] Ao abrigo do artigo 241.º da Constituição da República Portuguesa.
[5] Cf. a alínea c) do n.º 1 do artigo 57.º , conjugada com a alínea b) do n.º 3 do artigo 58.º e n.º 4 do artigo 36.º, todos do RGPD, Regulamento (UE) 216/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de abril de 2016, em conjugação com o disposto no artigo 3.º, n.º 2 do artigo 4.º e da alínea c) do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto.
[8] Poderá ser consultada na página da CNDP em: 2023-04-18_transmissão-internet-reuniões-órgãos-autarquicos.pdf
