Pedido de esclarecimento sobre férias não gozadas
I - O pedido:
O Senhor Presidente da Junta de Freguesia…, através de email de 06 de fevereiro de 2025, vem “solicitar esclarecimentos relativamente a férias não gozadas por 1 funcionária que se encontra de baixa médica:
- A funcionária entrou de baixa médica em 01/05/2023 e encontra-se ainda de baixa. A Junta procedeu ao pagamento dos subsídios de férias de 2023 e 2024. Tem a funcionária direito ao recebimento de férias não gozadas, atendendo que pertence à CGA?
II - Análise:
Os trabalhadores inscritos na Caixa Geral de Aposentações até 31 de dezembro de 2005 estão enquadrados no Regime de Proteção Social Convergente, RPSC[1], e nestes termos, considera-se que a trabalhadora em causa está abrangida por este Regime.
A estes trabalhadores, conforme resulta do artigo 14.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (redação atual), é aplicável o regime de faltas por doença previsto no artigo 15.º e seguintes da mesma Lei.
Na verdade, a Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, de acordo com o seu artigo 2.º, aprovou em anexo a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, LGTFP, mas a disposição do artigo 15.º constitui uma norma especial, ou seja, prevalece sobre as normas da LGTFP que disponham sobre a mesma matéria, conforme esclarece a Direção-Geral da Administração e Emprego Público, DGAEP, nas suas FAQ - Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas[2]:
“XI-A - Efeitos da suspensão do vínculo nas férias do/a trabalhador/a do RPSC:
Não. A disposição do artigo 15.º do diploma preambular da LTFP é uma norma especial, constituindo-se como um regime jurídico específico que regula os efeitos das faltas por doença aos trabalhadores abrangidos pelo RPSC, a qual prevalece sobre as normas da lei geral que disponham sobre a mesma matéria, não sendo assim aplicável a estes trabalhadores o disposto nos artigos 278.º (suspensão do vínculo de emprego público), artigo 129.º (efeitos da suspensão) e do artigo 127.º (direito ao gozo de férias após a cessação da suspensão) da LTFP;
Deste modo, as faltas por doença, superiores a 30 dias, dadas pelos trabalhadores que se encontrem integrados no RPSC, não implicam a suspensão do vínculo de emprego público, nem determinam quaisquer efeitos sobre as férias.”
Assim, estando a trabalhadora abrangida pelo RPSC, e muito embora tenha estado ausente por motivo de doença, o seu contrato não se suspendeu, tendo esta adquirido, a 1 de janeiro de cada ano, o direito a 22 dias de férias, aos quais acrescem os dias por antiguidade a que tiver direito, de acordo com os n.ºs 2 e 4 do artigo 126.º da LGTFP.
Deste modo, considerando que o artigo 15.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, “regula de forma plena todos os efeitos das faltas por doença dos trabalhadores em funções públicas integrados no RPSC, afastando, por conseguinte, a aplicação dos artigos 278.º, 127.º e 129.º da LTFP[3]”, conclui-se que não se aplica o direito ao pagamento de férias não gozadas, previsto no n.º 1 do artigo 129.º da LGTFP[4].
Por outro lado, de acordo com o mesmo regime, está abrangida pelo prazo máximo de ausência por doença, de 18 meses, ou da prorrogação, por 18 meses, no caso de se tratar de doença incapacitante que exija tratamento oneroso ou prolongado[5], nos termos dos artigos 25.º e 37 .º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (redação atual).
Significa, portanto, que este regime de faltas por doença prevê limites, e que de acordo com estes, é de aguardar que a trabalhadora seja considerada apta a regressar ao serviço (artigos 29.º e 30.º), ou que seja encaminhada para submissão à junta médica da CGA, no decurso da doença, ou findo o prazo máximo de ausência previsto para a situação de doença em causa (artigos 34.º e 36.º).
Neste quadro legal, sem estas decisões, não é possível concluir pela impossibilidade do regresso ao serviço, e consequentemente, pela impossibilidade do gozo de férias vencidas e não gozadas.
Na hipótese do regresso ao serviço, alerta-se, no entanto, para o disposto no n.º 5 do artigo 34.º da Lei 35/2014, de 20 de junho (redação atual): findo o prazo de 18 ou 36 meses na situação de faltas por doença, passa igualmente à situação de licença sem remuneração o trabalhador que, tendo sido considerado apto pela junta médica da CGA, I.P., volte a adoecer sem que tenha prestado mais de 30 dias de serviço consecutivos, nos quais não se incluem férias.
Caso venha a cessar definitivamente funções, por decisão da CGA, sem ter regressado ao serviço, fica demonstrada a impossibilidade do gozo das férias a que tiver direito, e assim, à data da cessação tem direito à retribuição correspondente, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 245.º do Código do Trabalho.
III – Em conclusão:
Com fundamento no exposto, mantendo-se a trabalhadora em situação de faltas por doença, não é possível concluir quanto ao seu regresso ao serviço, e consequentemente, quanto à impossibilidade ou não do gozo das férias vencidas e não gozadas, devendo aguardar-se o resultado da junta médica competente;
Na hipótese de ocorrer a cessação definitiva de funções, a trabalhadora tem direito a receber, na data da cessação, entre outros abonos, as remunerações correspondentes às ferias vencidas e não gozados, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 245.º do Código do Trabalho.
[1] De acordo com o artigo 11.º da Lei n.º 4/2009, de 29 de janeiro ( versão consolidada), os trabalhadores, abrangidos pelo regime de proteção social da função pública à data de entrada em vigor desta lei e que se encontrem a exercer funções em entidades empregadoras públicas, aplica-se o regime de proteção social convergente.
[2] DGAEP - Direção-Geral da Administração e do Emprego Público
[3] Neste sentido a Circular n.º 01/2020,/DGAEP, de 21 de fevereiro de 2020.
[4] Aplica-se aos trabalhadores abrangidos pelo Regime Geral de Segurança Social.
[5] Doenças definidas pelo Despacho Conjunto n.º A-179/89-XI, de 22-09, DR, II, n.º 219, de 22-09-1989.